"A avaliação funcional com fio-guia de pressão continuará a aumentar"
Brilhante entrevista ao cardiologista Alfonso Jurado onde explica a implicação dos fios-guia de pressão no tratamento da doença multivaso
"No futuro assistiremos a uma maior utilização do fio-guia de pressão e novos índices não hiperémicos". Quem o diz é o cardiologista de intervenção Alfonso Jurado Román, do Hospital General Universitario de Ciudad Real, que participou num “Case Report” sobre a “Utilidade do fio-guia de pressão no tratamento da doença multivaso complexa'. Nele descreve-se o caso de uma revascularização coronária percutânea guiada pela técnica de reserva fracional de fluxo e o valor de dita ferramenta diagnóstica neste contexto. Jurado explica os detalhes do seu interesse à Redação Médica.
Qual o significado dos resultados obtidos neste Case Report? Que resultados importa destacar?
O caso é bastante completo porque descrevem-se várias das vantagens da avaliação funcional das estenoses coronárias relativamente à angiografia convencional. Possivelmente, o resultado mais relevante é que a utilização do fio-guia de pressão permitiu, neste caso, reclassificar a paciente de uma hipotética doença multivaso para uma doença funcionalmente significativa de um único vaso. Isto tem implicações prognósticas e terapêuticas relevantes.
O que é que esta técnica traz de novo comparativamente a outras técnicas de diagnóstico atualmente utilizadas?
A avaliação da reserva fracional de fluxo (FFR) com fio-guia de pressão é a prática de referência para avaliar as estenoses coronárias moderadas que não tiveram um teste de deteção de isquemia não invasiva. Também revelou ser bastante útil nos casos de doença multivaso. Ambas as indicações coexistem na nossa paciente.
Normalmente, a avaliação das lesões coronárias é feita mediante a estimativa visual das estenoses angiográficas. No entanto, há já vários estudos que sustentam que esta avaliação angiográfica visual das estenoses está sujeita a uma grande variabilidade. A relevância hemodinâmica de estenoses visualmente moderadas altera bastante. De facto, em alguns desses estudos, como por exemplo no “FAME”, apenas 35 porcento das estenoses entre 50 e 70 porcento eram hemodinamicamente relevantes. Mais, 20 porcento das estenoses angiográficas entre 70-90 porcento não eram hemodinamicamente significativas. Portanto, calcular as lesões recorrendo apenas ao visual pode levar a erro.
Existem outras técnicas de avaliação intracoronária, como a ecografia intravascular (IVUS) ou a tomografia de coerência ótica (OCT), que também fornecem informação no caso de lesões duvidosas, mas é sobretudo informação anatómica comparativamente à informação funcional que o fio-guia de pressão oferece. São técnicas complementares.
Para que tipo de pacientes e em que tipo de lesões, está indicada?
A avaliação da reserva fracional do fluxo com fio-guia de pressão é a prática de referência de avaliação funcional em pacientes que têm lesões angiograficamente moderadas e que não obtiveram uma avaliação de isquemia em testes não invasivos, ou para aqueles pacientes que têm uma doença multivaso.
O que teria acontecido se tivessem sido implantados stents na paciente?
Provavelmente, tudo teria corrido bem, mas devemos basear as nossas terapias nas evidências científicas de que dispomos. E a realidade é que os dados dos estudos com muito pacientes com cardiopatia isquémica crónica indicam que a revascularização apenas é superior ao tratamento médico ótimo quando há uma comprovada isquemia significativa.
Embora os resultados de uma angioplastia coronária com implante de stents de última geração sejam bons, atendendo à atual taxa de sucesso que se situa acima dos 95 porcento e à baixa taxa de complicações durante o procedimento, os stents têm uma taxa de restenose e trombose que, embora baixa, deve ser tida em consideração. Sem dúvida, não implantar um stent é mais sensato nos casos com um bom prognóstico em termos de tratamento médico tradicional (os com FFR>0,8).
Esta paciente também apresentava uma lesão bifurcada. Os resultados do tratamento percutâneo destas lesões são piores aos das lesões não bifurcadas. O fio-guia de pressão foi útil para determinar se efetivamente esta lesão requeria uma revascularização. Portanto, a revascularização guiada por FFR foi determinante para decidir que lesões tinham de ser tratadas e as que não.
Como vê o futuro da utilização do fio-guia de pressão?
A avaliação funcional com fio-guia de pressão tende a aumentar, em virtude dos dados registados pela Secção Hemodinâmica (SHCI) da Sociedade Espanhola de Cardiologia (SEC), onde se pode constatar ter havido, no último ano, um aumento de 23,2 porcento da sua utilização (7003 procedimentos com fio-guia de pressão realizados em 2017 face aos 5686 do ano anterior).
No futuro também aumentará a aplicação de novos índices para a avaliação funcional comparáveis ao FFR. Para realizar a FFR é necessária uma hiperemia máxima que normalmente se consegue com fármacos como a adenosina. A administração destes fármacos pode associar-se a uma baixa taxa de efeitos secundários, para além de um custo mais reduzido. Os novos índices “não hiperémicos” como o iFR ou o RFR não necessitam destes níveis máximos de hiperemia, simplificando o procedimento. Nos estudos que existem até à data (sobretudo com iFR) a avaliação funcional demonstrou não ser inferior à realizada com FFR. Concluindo, provavelmente no futuro assistiremos a uma maior utilização do fio-guia de pressão e de índices não hiperémicos.
Muito obrigado ao Dr. Jurado por esta entrevista, para obter mais informação sobre os fios-guia de pressão clique aqui